"E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava?
Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate.
Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas.
Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim.
Carnaval era meu, meu."

(Clarice Lispector )







terça-feira, 20 de maio de 2008

Olinda, segundo Gilberto Freyre

Largo do Amparo


“Não se pode falar de Olinda, esquecendo sua luz. Não sua luz elétrica: mas a sua luz de sol. É ela que dá às águas do mar que se vêem do alto de qualquer dos oito montes de Olinda e aos montes da cidade que se vêem do alto-mar, vindo de vapor da Europa ou dos Estados Unidos, do Norte ou do Sul do Brasil, a riqueza extraordinária da cor que encantou o alemão Gunther e já tinha encantado o pernambucano Joaquim Nabuco.
Para Nabuco, a beleza de Pernambuco vinha principalmente de sua luz. Tudo que ele exalta, em página célebre, na paisagem de Pernambuco, em geral, e na de Olinda, em particular, é efeito de luz: o céu que não é o mesmo um minuto; o mar que está sempre mudando de cor; o brilho metálico do espanador de coqueiros; a sombra rendada das jaqueiras e mangueiras. É ainda a luz: o céu que não é o mesmo um minuto; o mar que está sempre mudando de cor; o brilho metálico do espanador de coqueiros; a sombra rendada das jaqueiras e mangueiras. É ainda a luz que deixa ver o fundo da areia do Beberibe tornando outrora tão gostosos os seus banhos. Que dá vida às ruínas sufocadas pelos matos.
Que dá brilho aos azulejos velhos das sacristias, dos corredores de convento, das frentes dos sobrados, mas não deixa que eles nos doam cruamente nos olhos! Que não deixa que os vultos dos mosteiros e das igrejas dominem Olinda com abafados de sombras duras, negras e tiranicamente clericais, povoadas de corujas e morcegos, mas que adoça-as em sombras tão boas que não há, no meio delas, quem se sinta brasileiro sem se sentir, ao menos por um instante, ou, pelo menos franciscanamente, católico. Não só as árvores, como os passarinhos e as crianças, tem de Olinda uma intimidade com as igrejas velhas que em poucos lugares será tão grande; e tudo por causa da luz que faz a natureza estar sempre refrescando a tradição; que dá coragem às lagartixas para passearem pelos pés dos São Bentos mais sisudos; coragem aos passarinhos para pousarem nos São José dos altares, nas próprias coroas de ouro das Nossas Senhoras.
Que luz é esta – a que dá a estes montes, a estas praias, a estas águas, e às suas casas, às suas igrejas, às suas barcaças a vela, uma doçura que nem toda luz tropical dá às coisas e aos homens? Que faz dizer um homem alemão, e um homem de ciência viajando, conhecedor de outras terras dos trópicos: “quem sentiu uma vez o encanto desta luz se sentirá sempre tentado a voltar a estas latitudes”?
Será por causa dela - dessa luz -, que os habitantes desta parte do Brasil são tão fiéis ao seu torrão”, reparou o alemão de sua cadeira de balanço no Mosteiro de São Bento. A luz do sol no Brasil – escreve ainda o Professor Gunther, referindo-se principalmente a Pernambuco – parece ter uma qualidade diferente da luz do sol na Índia. “É que na Índia, observou ele, os raios amarelos parecem ser predominantes. Daí ser preciso, quando se tiram fotografias, dar exposição mais longa do que no Brasil ou na Europa.” ...


(Fragmentos do livro Segundo Guia Prático, Histórico e Sentimental de Cidade Brasileira , de Gilberto Freyre/ Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro 1968).



FONTES:

Texto:
http://www.pauloklein.art.br/reportagem01b.htm

Imagem: Largo do Amparo-Olinda
http://www.shunya.net/Pictures/Brazil/RecifeOlindaIlheus/OlindaStreet2.jpg

7 comentários:

vieira calado disse...

Olinda, deve vir de ó linda!
Será?
Um abraço

Carlinhos do Amparo disse...

Há muitas lendas sobre a origem do nome, mas essa é a mais famosa:
quando Duarte Coelho aportou em Pernambuco, viu ao longe as colinas e comentou com seu capitão-mor: Ó linda situação para erguermos uma cidadela!
E daí teria surgido o nome da cidade.
Abraçamigo, Vieira!

Ilaine disse...

Oi, Carlinhos!

Nossa, que lindo post. Achei muito interessante o texto de Gilberto Freire. Ela fala da luz de Olinda. Uma luz que enfetiçou o meu filho e a mim também. Nos emocionamos ao ver o mar lá da colina... Inspirei a brisa e me senti brasileira por todos os poros. Luz de Olinda! Banhada pelo calor tropical de minha terra.

Forte abraço
Ila

Carlinhos do Amparo disse...

Venha sempre nos visitar. Calor tropical e calor humano tem a nossa terra!
Abraçamigo, Ilaine.

Jacinta Dantas disse...

Ei Carlinhos,
já tive a graça de pisar no chão de Olinda, e com certeza, a luz saltou-me aos olhos, aos poros, aos sentimentos. Gostei muito do texto com palavras que foram fazendo o movimento de exaltação às belezas de Ó Linda.

Abração

Aldrin Iglesias disse...

Inteligência e lirismo, Freyre era bom de serviço, héin?

Nunca fui a Olinda. Pena.

Abraços de um mineirinho

Aldrin Iglesias disse...

Ei!, volte sim, volte sempre1

Como posso conquistar o universo e o espaço sideral sem comentários em meu blo?

rsrsrs ...

Abraços!