"E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava?
Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate.
Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas.
Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim.
Carnaval era meu, meu."

(Clarice Lispector )







sábado, 3 de maio de 2008

Sítio Intra-histórico d'Olinda




O Sítio d'Olinda não é apenas patrimônio histórico. É, essencialmente, um patrimônio intra-histórico. O intra-histórico, aqui, assemelha-se ao que modernamente chamamos, mutatis mutandis, de patrimônio imaterial . Aquilo que, criado numa geração, vai sendo repetido pelas outras, até tornar-se um verdadeiro automatismo, quase instintivamente recriado no presente dos gestos, das falas e até dos balbucios.


Esse conceito de intra-história foi desenvolvido pelo pensador basco Miguel de Unamuno. Se há um presente momento histórico, dizia ele, deve haver um momento presente não-histórico. A história, para Unamuno, brota dessa não-história, assim como das madréporas suboceanicas brotam, depois de séculos, as ilhotas de coral.

Essa não-história, ou intra-história, não está enterrada no passado dos livros, papéis, monumentos e ruínas de pedra. Palpita bem viva no presente, na vida silenciosa da imensa humanidade anônima, que porfia dia e noite em seu labor cotidiano.

O Sítio d'Olinda é residência habitual do intra-histórico. Gravado ele está, de há muito tempo, na prosódia peculiar de nossa gente; no gosto secularmente apurado do condimento das panelas de barro de nossas matronas; na rapidez do gesto, mil vezes repetido, do tirador de coco, alpinista dos abundantes coqueirais dessa Olinda imemorial.

Aqui há uma crosta de intimidade familiar, de permanência e tradição, em que se ouve o vozear terrunho da intra-história. Aqui o passado somente não morreu, mas convive todo dia, permeando cada um de nós. Tradições antiqüíssimas estão amalgamadas no regaço do cotidiano do Sítio d’Olinda, onde o presente é como um colo materno, que nos agasalha contra os ventos velozes das mudanças.

Aliás, nada temos contra o novo. Mas residir neste sítio intra-histórico de Olinda é libertar-se da temporalidade fática, livrar-se da novidade pela novidade, e mergulhar silenciosamente na convivência serena com o presente imaterial. Quase que ia dizendo, no presente virtual... Paz e fraternidade a todos!

 Fonte da imagem:
 http://igatur.googlepages.com/alain-033.jpg/alain-033-full.jpg

5 comentários:

Dora disse...

É um sítio a-temporal quase! Fiquei enlevada com Olinda, desde lá debaixo com a foto!
E não consigo entender o "compadre" Eurico deixar esse espaço de paraíso!
Tive a sensação estranha que o texto em prosa aqui é de um alter-ego do Eurico.Para mim, é ele, proseando...
Carlinhos do Amparo, no entanto, é o amigo. Mas, um amigo que parece consagüíneo na visão demais semelhante de " enfocar" a realidade!
Eu volto aqui.
Há muito a se conversar...
Abraço.
Dora Vilela

dade amorim disse...

Lindo blog, Carlinhos! Conheço Olinda e morro de saudade dessa cidade belíssima.
Grande abraço.

Unknown disse...

Quase senti o cheiro de Olinda, cheguei mesmo a adoçar-me com seu gosto. OH! prosa boa Moço, que tal um contra-frevo, só para comemorar? Bom , que Madame Mim mostrou-me suas veredas. nanamerij

Ilaine disse...

Oi, Carlinhos!

Fiquei muito feliz com sua visita em meu blog. Obrigada e apareça sempre.

No ano passado eu trouxe minha família para conhecer este pedaço maravilhoso do Brasil: Pernambuco. Conhecemos Olinda, Recife e Porto de Galinhas. Adoramos, simplesmente. Tenho saudades.

Muito bonito o seu blog, amigo. Voltarei.

Abraço

Loba disse...

Salve, compadre!
E eis que Carlinhos do Amparo se mostra poeta do intra-histórico, já que do Sítio ele é fazedor de história.
Gostei do didatismo do texto e, especiamente, do orgulho de amante que vejo dançando pelas palavras.
E até deu um tico de inveja.
Estou esperando o convite pra levar minha mineiridade a misturar-se a esta vida que pulsa neste pedacinho de Olinda, tá? rs...
Um beijo!