"E quando a festa já ia se aproximando, como explicar a agitação que me tomava?
Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate.
Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas.
Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim.
Carnaval era meu, meu."

(Clarice Lispector )







sexta-feira, 3 de abril de 2009

Coprocultura é Cultura?

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Prezado Compadre,
Tou aqui de novo.


E começo com mais essa provocação. Aqui no nordeste, quando um cidadão veste sua roupa domingueira e sai todo perfumado, ouve logo um gracejo:
Vai fazer exame de fezes, ?
É isso que me invoca, compadre, essa tal coprocultura. Parece que cultura é uma palavrinha que cabe em todo canto. Fui então ao pai dos burros e descobri que o biomédico vai "cultivar" os microorganismos que existem na amostra fecal do paciente. Copro é excremento, escória, fezes. E cultivar é fazer cultura. Pronto. Ta explicado.

Mas, cuidado. Um homem de vasta cultura não é um biomédico de larga experiência, compadre. Muitos bem que debruçam-se sobre verdadeiras escórias.
No entanto, há usos diferentes para essa palavrinha. Cada um “cultiva” um significado pra ela, ?
E a partir dessa palavra “cultivar”, passo a transcrever o que entende o Dr. Crippa sobre Cultura:

“O homem apresenta-se, desde o início, como cultivador. Não só da terra, dos rebanhos e das forças da natureza. Cultiva seus gestos, suas expressões, sua fisionomia, seus hábitos de habitar, de vestir-se e alimentar-se. Cultiva a amizade, cultiva o espírito, cultiva as relações com os entes divinos que iluminam a cena inaugural. Cultivar é um gesto profundamente humano quanto o de cultuar. Há um culto imerso no gesto de cultivar, da mesma maneira que todo gesto de cultuar manisfesta o cultivo de alguma coisa. Cuidar, pastorear, cultivar, cultuar, são gestos idênticos entre si. Trata-se sempre do homem reclinado sobre as coisas, sobre si mesmo, sobre suas significações últimas, adequando e moldando o mundo às formas que se constituem em seu espírito imaginativo e criador.” ( Adolpho Crippa, Mito e Cultura, 1975, p. 182)

Até aqui nada de novo, né, compadre. Entendi, disso tudo, que o homem "cultiva a cultura", se assim posso dizer. O danado é que muitos homens passam a vida a produzir material para dar trabalho aos biomédicos. Ou seja, a fazer merda na vida. rsrsrs

Aqui me despeço,
porém, me aguarde, pois o Crippa tá blefando, fazendo retórica por desfecho, com essa coisa de afirmar que a cultura é produto do homem. O livro avança e ele irá nos surpreender com as conclusões a que chega. Na verdade ele crê que é a cultura que faz o homem.

Mas, aguarde a próxima missiva.


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Um comentário:

carlinhos do amparo disse...

Muito bom, cumpadi. Além de passar o conteúdo, ainda tem a descontração necessária para tema tão profundo.
As Cartas estão no ponto certo. Breves e com conteúdo.
Abraço e seja muito bem vindo.